segunda-feira, 26 de fevereiro de 2007

O velho louco

Tinha o apelido de Sousa. Caminhava focando o chão para sentir o piso firme com o olhar, dentro da sua cabeça maus pensamentos. Os óculos sujos assim permaneciam. Tonalidades difusas confundiam-no. Desorientado espacialmente, abandona por longos instantes o redor circundante. Teme tudo e todos. Embateu com o ombro no corpo de uma mulher vestida de rosa choque e na mão uma cesta com flores. Perdido proferiu "Quero viver e ser livre!". Caiu no chão. Na rua paralela à sua avista um casal abraçado. A mulher cambaleava, abraçando-se ao braço forte do marido, que prontamente a socorreu e segurou. A multidão continuava ao seu ritmo. Frenético. Mesmo em tempo de férias e lazer. A multidão, seus membros, seres humanos, alheios a toda essa dor, desprovidos de sentimentos de inter-ajuda. Ninguém se prontificou a sequer perguntar se era necessária ajuda ou "alguma coisa". Atravessa a rua, olha fixamente aquele cenário de dor e diz: - "Mulher, eu que não me sinto louco, atrevo-me a perguntar-lhe se precisa de mim para alguma coisa. Sabe, eles vivem depressa demais. No meu tempo andávamos de carroça e não tínhamos a pressa destes que têm carros velozes mesmo à porta de casa. Precisa de mim para alguma coisa?". O casal continua o seu percurso, num extenso areal, pesaroso de alcançar o seu fim. Ela segura o corpo numa só perna. É criança. A multidão levanta-se, cruza os braços, nessa curiosidade mórbida que é a de ver a aflição dos outros e pior, não ajudar, não reagir, não indo ao encontro de quem precisa.
Os loucos são estes basbaques egoístas.
31 Julho 2005

Um comentário:

Anônimo disse...

Gostei mt e acho q terminaste em grande.

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