terça-feira, 31 de julho de 2007

Dias Abstractos



digo bom dia ao amanhecer:
sei que assim acordará brilhante e mais azul.
Digo-lhe, ainda debaixo do calor de uma noite: sonhei contigo.
Recolho-me no silêncio cálido dos pensamentos: unicamente eu e eles. E nos ruidos do silêncio, a vizinha que caminha com os mesmos saltos de todas as noites. os ruídos do silêncio...
Nos canos corre água.
A minha insónia.
A porta range e os carros avançam. as céluas renovam-se e a vitalidade fluí, pela janela corre água que cai dos canos, da vizinha que caminha com os mesmos saltos todas as noites.
"nada em ti me surpreende"
que quer dizer:
"tudo em ti ... "

todos te sorriem apenas porque tens um grau de parentesco com alguém. esse alguém, é também ele um hipócrita. e se te sorrimos, somos como ele, como tu: hipócritas.
será que não te apercebes de que todos os sorrisos são iguais? ou por serem "tão iguais", tão cópias uns dos outros, não te permite (ou tanto-te-faz) perceber que de nada têm de verdadeiro?
também eu te sorrio... que vergonha... talvez porque te vejo sempre numa hora de descontracção. mas os outros sorriem-te como hipócritas engraxadores. mas porque raio escrevo sobre ti? talvez porque representas tantos outros: que se acham importantes só porque são isto ou aquilo, não te iludas: não passas de mais um/a cheio/a de vaidades e arrogâncias...
que lamentável é, serem gentis connosco só porque te achas importante...
isto cria-te, indubitavelmente, dormência: de sentimentos (falsos), de parecer o que não é...
e os culpados somos nós: que te sorrimos porque somos, tal como tu: hipócritas bajuladores.

Eu nunca te sorri com sinceridade, em mim não viste olhos brilhantes de admiração.
Os meus olhos são a minha alma.

sexta-feira, 20 de julho de 2007

Trabalho o poema sobre uma hipótese: o amor
que se despeja no copo da vida, até meio, como se
o pudéssemos beber de um trago. No fundo,
como o vinho turvo, deixa um gosto amargo na
boca. Pergunto onde está a transparência do
vidro, a pureza do líquido inicial, a energia
de quem procura esvaziar a garrafa; e a resposta
são estes cacos que nos cortam as mãos, a mesa
da alma suja de restos, palavras espalhadas
num cansaço de sentidos. Volto, então, à primeira
hipótese. O amor. Mas sem o gastar de uma vez,
esperando que o tempo encha o copo até cima,
para que o possa erguer à luz do teu corpo
e veja, através dele, o teu rosto inteiro.
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Nunca são as coisas mais simples que aparecem
quando as esperamos. O que é mais simples,
como o amor, ou o mais evidente dos sorrisos, não se
encontra no curso previsível da vida. Porém, se
nos distraímos do calendário, ou se o acaso dos passos
nos empurrou para fora do caminho habitual,
então as coisas são outras. Nada do que se espera
transforma o que somos se não for isso:
um desvio no olhar; ou a mão que se demora
no teu ombro, forçando uma aproximação dos lábios.
Nuno Júdice

terça-feira, 17 de julho de 2007

nascer diferente




"Gosto muito de ajudar o próximo, preocupo-me sempre mais pela dor e necessidades do meu próximo do que comigo, quando eu consigo ver a força de vontade de tantas outras pessoas que sofrem mais do que eu, e que me ajudam tanto a enfrentar a minha deficiência, sinto que a minha verdadeira alegria é dar alegria aos outros, isso ajuda-me a enfrentar o meu problema físico, pensar só em nós não é viver."



Rosa, e eu que pensava que não podiam haver pessoas que "sofrem mais que tu"...
Obrigada por existires!

quinta-feira, 12 de julho de 2007


Encontraram-te caída. Uma despensa como todas as que existem em todas as casas: claustrofóbica.
Deixaste, em cima da mesa, um anel prateado – e pelo que contei nele – trinta e sete letras e nenhuma forma a palavra que conheço, que quero encontrar e que me leve ao decifrar do porquê do teu corpo junto a um balde ainda molhado e meticulosamente arrumado por ti…
Vasculho os teus livros (tantos). Caem deles recortes de imagens e rostos com cores – tanta vida aqui espelhada – bilhetes de concertos que não foste e que pedias ao teu primo Óscar. Tinhas todos.
Do chão agarro uma mortalha enrugada, que quase não parece uma mortalha.
E nestes livros.
(Tantos)
Tento encontrar-te
Um sinal
Terás deixado dentro deles o motivo da tua morte? Uma frase? Um desenho? Um pensamento sublinhado? Uma folha rasgada sob fúria?
Procuro-te, “com uma dispersão de pardal”, em cada frase, em cada palavra riscada, em cada flor e sorriso que desenhaste aliados ao sentido de todas as ideias que te faziam sorrir, por dentro, sem que ninguém soubesse, sem que ninguém desse conta.
(talvez nessa alegria - que não tinhas – adivinhe o desejo da tua morte)

“Ás vezes, como agora, é assim: ponho-me diante do papel e não sai nada, as palavras recusam-se, as coisas que andam na minha cabeça não se fixam nem descem para a mão, e vai daí continuo sentado, à espera, neste trabalho de paciência, a ver quem é mais teimoso, se a minha cabeça, se eu.”

Nada me leva à razão de te perder. Nada.
Continuo a procurar-te por entrelinhas traiçoeiras e sinuosas.
… E encontro as tuas paixões: a botânica, o mar, os tubarões, as orquídeas, as casas de banho com música e café. Encontro-te, como sempre: apaixonada, simples, de humor flutuante. Tão simples que me assustavas.
Eu, raramente soube sê-lo, era um esforço que fazia (porque só assim te podia ter junto a mim)

Fingindo ser eu

Ligo à única pessoa que amas. Disse-lhe que deixaste um poema de duas linhas (quase) simétricas – a longevidade da tua dor demarcada ali – tão real, tão dilacerante
Duas simples frases
Simplesmente tuas
Unicamente duas simples frases
Tão simples como tu

“Por ser tua
Deixarei de ser

sexta-feira, 6 de julho de 2007

” O que dás, Momo, é teu para sempre;
o que guardas, está perdido para sempre.”
Eric Emmanuel-Schmitt

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